A propósito de algumas comparações descabidas que têm sido feitas acerca do "banco bom" e do "banco mau", e do facto de os aciostas terem sido "expropriados" da parte boa do banco, resolvi criar uma pequena história para ver se percebem o que se está realmente a passar.
O senhor Zé tinha uma padaria muito rentável no bairro onde morava.Como o negócio ia de vento em popa, o Sr. Zé viu ali uma oportunidade legítima de crescimento, arranjou uns amigos que entraram também com algum dinheiro e criaram uma empresa que geria não só essa padaria mas mais algumas que entretanto abriram noutros locais. Para potenciar a coisa resolveram abrir outros negócios complementares, como cafés e restaurantes. Os outros negócios não tinham, nem de perto nem de longe, a mesma rentabilidade que a sua padaria, mas não fazia mal, no geral os lucros aumentaram porque o volume de negócios era muito maior. Havia apenas um pequeno problema, o Sr. Zé estava a perder o controle sobre tudo, já ra difícil gerir a padaria quanto mais tudo o resto que entretanto foi sendo criado.
E chegou a crise. Os negócios que já não davam grande coisa ficaram ainda piores, os que eram bons davam menos e não conseguiam já pagar os prejuízos dos primeiros. Mas há que ter esperança, isto vai acabar por melhorar. Entretanto as dívidas a fornecedores aumentavam, o dinheiro da padaria que, embora já estivesse longe de dar os rendimentos de outros tempos, ia chegando para tapar alguns dos buracos e manter os negócios abertos. Aos amigos que tinham colocado o dinheiro nos negócios, o Sr. Zé ia dizendo que estava tudo bem, que os momentos não eram fáceis mas que estava tudo controlado e não tardaria muito a que a coisa voltasse aos lucros consistentes. Contava também com a preciosa ajuda do contabilista responsável pelas contas da empresa, que escondia algumas dívidas e créditos incobráveis, Por exemplo, continuavam a aparecer nas contas um montante significativo de uma dívida às padarias de uma conhecida cadeia de restaurantes, que entretanto até já tinha falido, ou seja, eles já deviam ter reconhecido aquele prejuízo, já que nunca mais iriam recuperar aquela dívida.
Para tapar mais alguns buracos o Sr. Zé foi pedindo emprestado a alguns clientes e amigos aos quais prometeu juros acima da média. O negócio parecia sólido, o contabilista assegurava as contas, era dinheiro em caixa para estas pessoas.
Até que a situação complicou-se, o Sr. Zé reuniu os amigos e, em vez de lhes contar claramente o que se passava, disse-lhe que a situação estava muito melhor, que os lucros estavam de volta mas seriam ainda maiores se injetassem algum dinheiro na empresa, para as coisas serem mais rápidas Além disto o contabilista também lhe tinha dito que havia "uns rácios, ou lá o que era, que deveriam ser repostos, enfim apenas coisas de contabilistas, porque o negócio, esse está de novo em grande pujança", ajudado também por alguma recuperação económica que já se sentia. Os amigos foram na conversa do Zé (agora já não lhe chamo senhor), afinal até o contabilista assegura as contas e o estado da empresa. "O tipo pertence lá á Ordem dos técnicos Oficiais de contas, ou lá o que é, está obrigado a transmitir a verdade sobre a empresa e a fiscalizar tudo, ele não nos ia enganar, e se é para isto melhorar ainda mais depressa mais ganhamos"!
Esta foi uma última tentativa do Zé para salvar a situação, infelizmente ela estava já condenada ao fracasso, os negócios estavam maus de mais para se poder dar a volta ao que quer que seja. Os cafés e restaurantes foram os primeiros a falir. A seguir vieram as outras padarias, até ao ponto em que ficou apenas a padaria inicial, aquela que aparentemente só podia dar lucros pois continuava a ter muitos clientes e a funcionar muito bem.
O problema é que esta padaria também tinha agora muitos buracos, a maioria dos quais relacionados com os restantes negócios que entretanto tinham aberto e que tinham falido. O contabilista apercebeu-se então de que o Zé tinha feito uma série de aldrabices, que tinha dado a padaria como garantia para uma série de empréstimos para os outros negócios, que já não pagava a alguns fornecedores, e que tinha alguns dos créditos que tinha apresentado afinal não valiam nada. Munido dos poderes que lhes são conferidos o contabilista retirou o Zé da gestão da empresa e nomeou outra pessoa externa para o fazer. Foram feitas uma série de avaliações à empresa e, como se previa, havia ainda mais problemas, era preciso ainda muito mais dinheiro para salvar a padaria, dos outros negócios já nem valia a pena falar, porque esses já eram.
Obviamente que os amigos que tinham investido tanto dinheiro no negócio ruinoso tinham perdido toda a confiança no Zé, não estavam agora dispostos a meter nem mais um tostão na padaria, quanto mais aquilo que o novo gestor lhes estava a dizer que era preciso. Ou seja, a padaria, tal como os outros negócios, estava falida!
Entretanto aparece alguém que apresenta uma solução que visava salvar alguma coisa, aquilo que ainda tinha valor. Reuniu com os amigos do Zé que tinham investido nos negócios e disse-lhes o seguinte: "Como ninguém está interessado em meter o capital que é necessário para salvar a padaria, eu entro com esse capital em nome do Sindicato dos Padeiros, cobro apenas um juro anual de 3%. Vocês ficam com todos os outros negócios e vejam lá se conseguem recuperar alguma coisa. Tentem recuperar alguns créditos sobre clientes, tentem vender os espaços por alguma coisa e o dinheiro que conseguirem arrecadar ficam com ele, ou melhor, não ficam porque, por Lei, aquelas pessoas que emprestaram dinheiro ao Zé têm direito de preferência, só depois de pagarem a esses é que ficam com o dinheiro para vocês. Entretanto recupera-se a padaria e dqui a algum tempo tentamos vendê-la, de preferência por um preço superior ao dinheiro que lá vou meter. Caso haja prejuízos na venda da padaria o Sindicato dos Padeiros terá de os assumir, caso contrário a imagem que sai cá para fora prejudica todas as padarias e isso a eles também não lhes interessa. De qualquer forma, é assim que as coisas funcionam, agora estamos na UE temos de fazer o que eles mandam. Se a venda da padaria der lucro, este será canalizado para vocês, e devem seguir a ordem já referida, primeiro pagam às pessoas que emprestaram dinheiro ao Zé, e se sobrar alguma coisa, ficam vocês com ele"!
E foi assim que foi feito... já agora, eu conheço um caso real mais ou menos idêntico, que se passou há uns anos, não com padarias mas com lojas de desporto. Nesse caso apenas o desfecho foi diferente, não se salvou nenhuma loja, nem a primeira que era um sucesso estrondoso!